
Senhora Presidente da Assembleia Municipal, na sua pessoa cumprimento o Senhor Presidente da Câmara, os membros da Mesa, os Senhores Vereadores e a Senhora Vereadora, o Dr. João Vargues e os responsáveis da CMF pelas Infraestruturas e Urbanismo, a Drª Elsa Nunes, que acabou de apesentar o Plano, as/os colegas autarcas e o público presente.
Sendo esta sessão da Assembleia dedicada a um gravíssimo problema como é o das alterações climáticas, começo por saudar a atribuição do prémio Gulbenkian para a Humanidade, à ativista Greta Thunberg, a qual tem sido incansável na luta contra as alterações climáticas.
Mas antes de entrar propriamente no tema, não deixo de manifestar a minha solidariedade para com as/os voluntários que, em Santo Tirso, ousaram pular a cerca da propriedade privada para salvar mais de uma centena de animais (cães e gatos), aqueles que conseguiram escapar à condenação pelo fogo, perante a insensibilidade dos proprietários. Devem ser apuradas as responsabilidades, também da autarquia... e da própria GNR se se deu o caso de, como dizem, ter agido tardiamente, dificultando o salvamento, com a desculpa de se tratar de propriedade privada...
Na preparação desta assembleia houve a proposta de intervenção de especialistas convidados pelos partidos. A ideia não foi consensual, porque, lamentavelmente, o Regimento da AM não o prevê, de facto...
No Plano de Adaptação às Alterações Climáticas está bem claro que essas alterações são resultado quase em absoluto da ação humana, concretamente pela libertação de gases com efeito de estufa.
O Acordo de Paris (de que os EUA estão saindo) pretende que o aumento da temperatura média da superfície terrestre, relativamente à era pré-industrial, não atinja os 2 °C até ao fim do século, sendo recomendável que esse valor não atinja sequer 1,5 °C.
A história climática do Planeta (Paleoclimatologia)diz-nos que a temperatura da superfície terrestre, há milhões de anos (concretamente, há 50 milhões de anos) já foi mais elevada do que é agora. Só que as alterações climáticas sempre ocorreram muito lentamente, de modo natural, o que deixou de acontecer na era pós-industrial, por ação humana, estando a ser abrupto o aumento da temperatura.
O atual sistema económico, extrativista, assente em combustíveis fósseis, em bens não duráveis e num sistema de produção orientado exclusivamente para a acumulação de capital é incompatível com a sustentabilidade ambiental. A urgência climática tem que levar as nações a alterar a formas de organização social e económica geradoras de crises humanitárias e de destruição da biodiversidade. A resposta às necessidades sociais deve ser dada por modos de produção sustentáveis.
Em Portugal, os efeitos do aquecimento global são visíveis, em particular nos incêndios florestais, na erosão costeira e na maior frequência de fenómenos climáticos extremos. Em breve, se nada for feito, as alterações climáticas atingirão um ponto de não retorno com efeitos devastadores para a natureza e para a humanidade.
Saúdo as preocupações manifestadas neste Plano, preocupações essas enquadradas pelo Objetivo 13, da ONU (medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactes).
De entre os 12 objetivos anteriores (e os seguintes), lembro o 1º, que é acabar com a pobreza, o 2º que é acabar com a fome, o 3º que reclama uma saúde de qualidade, o 4º sobre a Educação... e os outros sempre “a abrir”... O poeta não faria melhor ao reclamar a paz, o pão, educação, saúde, habitação,...
Só que, depois, os governos que nos anunciam o objetivo do paraíso na terra, são os mesmos que nos metem medo com uma tal “parede da realidade” onde vamos necessariamente bater com a cabeça – leia-se “modo de produção capitalista, indissociável da exploração do homem pelo homem”.
O Plano ora apresentado não é mais do que a aplicação ao concelho do PIAAC (Plano Intermunicipal de Adaptação às Alterações Climáticas).
Sem sermos relativistas ao ponto de nos deixarmos seduzir por teses trumpistas anti-científicas, não deixamos de recordar que há exemplos bastantes, como é o caso das multinacionais do agro-negócio, de que a ciência não é neutra. Mesmo numa área da Matemática, como é a Estatística, há quem diga com uma certa razão, que, se torturarmos os números, eles acabarão por dizer-nos aquilo que queremos ouvir...
Não se duvida da qualidade científica do Plano, inclusive com a assunção da incerteza no que se refere aos cenários RCP* 4.5 e 8.5 (este último, mais gravoso no que respeita à quantidade de CO2 na atmosfera).
Como defendemos em sede de AMAL, é muito importante adaptar-nos ao que aí vem (diminuição da precipitação média anual, ventos fortes e aumento dos fenómenos extremos, subida do nível médio da água do mar e aumento da temperatura média anual, sobretudo das máximas) mas, mais do que adaptar-nos, deveríamos tomar medidas – e é verdade que muitas estão contempladas neste Plano – para evitar as alterações climáticas. Bem sabemos que é difícil, basta lembrar-nos dos ainda recentes protestos contra a exploração do petróleo na nossa costa, e de quão difícil é lutar contra os todo-poderosos investidores, capazes de tudo, até de vergar governos.
Não obstante a qualidade do estudo, mantemos algumas reservas, por exemplo no que respeita às soluções para as ilhas barreira.
No caso particular da Praia de Faro, de entre 4 hipóteses, a defendida é a “Retirada e relocalização da ocupação (todas as habitações), com sucessiva renaturalização das zonas desocupadas”. Para isto está naturalmente previsto financiamento, que não será pouco.
Os núcleos habitacionais das ilhas barreira são, por definição, skateholders do projeto. As associações de moradores desses núcleos terão sido chamadas a pronunciar-se? Caso não tenham sido, será que em vez de skateholders temos um plano em versão shareholder, isto é, com consulta prioritária aos acionistas?
Termino com uma das razões de estarmos aqui e que é o que prometemos no nosso programa autárquico:
“Urge a requalificação e ordenamento das ilhas, com respeito pelas legítimas expetativas das/dos residentes, rejeitando decisões do tipo “cortar a direito”, cujo objetivo, como é habitual, se resume a “cilindrar” os mais fracos.”
Muito obrigado.
O membro do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal de Faro
* RCP – Representative Concentration Pathways