Após ter sido rejeitada a primeira proposta camarária de derrama relativa a este ano, o Executivo apresenta-nos nova proposta com uma alteração e um acrescento: Diminui a percentagem de 10 para 9% e anuncia que a verba será utilizada em investimento na área social, nomeadamente em equipamentos para a 1ª infância e idosos.
Porque não me foram distribuídas as declarações de voto feitas na sessão de Câmara em que a nova proposta foi debatida, só tomei conhecimento do destino a dar à verba na curta informação existente no site camarário.
Satisfaz-me a intenção anunciada. Dá ideia que serviu para alguma coisa o debate e os argumentos da primeira sessão em que o assunto foi discutido. Esperemos agora, que a grave crise financeira do município não lhe torça o destino ou reduza o montante. Esperemos também que a próxima proposta de Orçamento não se limite, nas áreas em causa, ao valor da derrama de 2006. A ver vamos.
Portanto, a rejeição da primeira proposta fez mudar alguma coisa. Infelizmente, apenas quanto baste. E, em minha opinião, o que mudou foi muito pouco. Não me refiro ao 1% de baixar de 10 para 9%. Mas à obsessão financeira que continua e que para tudo é desculpa. Ao continuismo das prioridades e das políticas seguidas.
Todos sabemos que o endividamento é muito grande e que é preciso controlá-lo. Cortar despesas e fazer o máximo de receitas. Mas não pode ser sempre do mesmo modo e a pender sempre para o mesmo lado. Para isso já nos chega o governo central.
Porém, no essencial, tem sido esse o modo da autarquia, passado um ano de mandato, desde o primeiro Orçamento de continuidade até às actuais propostas de derrama e de IMI:
O Executivo pegou no que está mais à mão e fez o que é mais fácil. Cortou avenças e contratos, puxou algumas orelhas – se calhar não as devidas, vendeu e vende património, cortou e corta despesas. Mesmo que alguns cortes não tenham sentido e outros sejam mais prejudiciais do que vantajosos. Mesmo que as vendas de património aumentem a incapacidade de gerar receitas futuras, de controlar o caos urbanístico ou o parque habitacional do concelho.
Por outro lado, mantém festas e espectáculos que podem ter muito de publicidade mas têm muito pouco de cultura. Continua a aventura de salvar o Farense à custa do erário público e da generalidade dos munícipes, só para satisfazer uma minoria de ferrenhos adeptos e por necessidades eleitorais, em vez de cortar a direito e chamar à responsabilidade quem tiver que ser chamado.
Continua o buraco negro do Estadio do Parque das Cidades e de outros buracos sem qualquer saída à vista.
Continua a entrega de serviços camarários a firmas privadas e empresas municipais que não diminuem os custos da autarquia, nem melhoram a qualidade dos serviços prestados, mas abusam de equipamentos e instalações municipais e originam o subaproveitamento de recursos humanos.
Nos impostos, penaliza-se a população em geral e os “assim, assim”… É a derrama, é o IMI, vão ser no futuro próximo as taxas municipais. É certo que estes impostos não penalizam todos os munícipes. Mas todos são penalizados com mais 8% no preço da electricidade, mais o aumento das taxas moderadoras na saúde, mais o aumento da água que a Águas do Algarve e tantas vereações estão mortinhas por impor.
Que pensa fazer a Câmara para suster ou atenuar estas calamidades para os munícipes farenses?
Diz-se que já fazem o que podem naquilo em que têm poder. E que no resto não podem. Já apoiam e isentam os muito pobres e os indigentes… Pudera! Não é nada para admirar – nesta crise em que vivemos seria possível também tirar a essas pessoas? Só se fosse para acabar com elas!
Diz-se que não se pode fazer nada quanto ao aumento da electricidade, da gasolina, das taxas moderadoras, das propinas, etc., etc. Lembro que era o que se dizia há vários anos sobre a necessidade da habitação social, sobre a saúde e a educação, quando não havia nenhuma responsabilidade camarária em relação a essas áreas. Mas agora já existem competências e obrigações, e o que é feito? Muito pouco.
Agora repete-se, em tom maior, e é verdade, que há competências mas não há verbas… Porque o governo não cumpre, corta no PIDDAC, cortas nos fundos das finanças locais.
Mas contra isso é preciso ter coragem política. E se é de elogiar a postura reivindicativa do presidente da Câmara, nomeadamente no programa Prós e Contras, faz falta muito mais acção e é de lamentar tanta solidariedade com o governo, da mais descarada à mais discreta. Sobretudo, é preciso falar claro aos munícipes, ouvi-los, dar-lhes oportunidade de participar nas decisões, pedir o seu apoio. Não para os levar à certa, mas para com eles enfrentar o economicismo extremista do poder central, o seu autoritarismo e a sua demagogia.
Afinal o que é que isto tem a ver com a derrama que agora discutimos? Para alguns não tem nada a ver. Para mim tem tudo.
Não resisto a repetir uma frase lapidar do sr. Gaspar Encarnação (PSD) que, quando ainda há pouco intervinha, à mesma pergunta vinda da bancada do PS: “- E a derrama?”… respondeu: “Se isto se alterar (a lei das finanças locais num sentido justo) a derrama pode acabar logo no dia seguinte”.
Por isso afirmo que se as preocupações que aqui coloco fossem as preocupações de quem propõe a derrama, provavelmente mesmo com uma percentagem ainda mais baixa estaríamos fazendo caminho para resolver a crise e as dificuldades camarárias. Mas se apenas houver a obsessão financeira e o “deixa andar”, nem a percentagem máxima vai resolver mais do que pequenas maleitas ou as aflições do momento.
Se as preocupações colocadas fizessem parte da proposta e das opções da Câmara, provavelmente eu estaria em condições de votar a favor desta percentagem ou até da anterior. De outro modo, não estou.
O deputado municipal do Bloco de Esquerda - Faro
26-10-06